Um dos aspetos mais importantes na altura de tomar a decisão de aceitar um novo cargo é o ordenado. Independentemente do quão interessante poderá ser esse novo desafio, a capacidade de responder às suas obrigações financeiras acaba por ser a prioridade para a maioria dos candidatos.
No entanto, para avaliar se está perante uma boa oportunidade, é imprescindível que saiba qual é a diferença entre o salário bruto e o salário líquido. Caso contrário, corre o risco de fazer negociações pouco vantajosas com o seu atual ou possível futuro empregador.
Para além de conseguir mais facilmente identificar uma boa oportunidade, perceber esta diferença também é importante para que faça uma boa gestão das suas finanças pessoais e orçamento familiar.
Qual a diferença entre o Salário Líquido e Salário Bruto?
O salário bruto também pode ser conhecido como salário base ou salário ilíquido. Este é o valor que está expresso no contrato de trabalho e a que o trabalhador tem direito, antes que seja feito qualquer desconto.
Quando olha para um recibo de vencimento, verá uma primeira linha que diz “ordenado base” ou “vencimento base” que corresponde ao valor do seu salário bruto.
No entanto, nestes mesmos recibos verá outros itens que irão corresponder a subsídios (o mais comum sendo o subsídio de refeição) e descontos que incidem sobre esse salário bruto. O valor final, após os respectivos descontos, é o que corresponde ao seu salário líquido.
Assim, o salário líquido é, na prática, o salário real que tem a receber no final de cada mês e que irá considerar para a gestão das suas finanças pessoais e orçamento familiar. A este valor também se pode chamar ordenado “limpo”.
É importante perceber quais são os impostos que tem de pagar e como, para que consiga ter uma melhor perceção sobre quanto irá, efetivamente, receber no final do mês por desempenhar determinada função.
Quais os impostos que tem de pagar e como pode calculá-los?
Apesar de haver alguns casos em que existem outros descontos, como é o exemplo de descontos para os sindicatos, há dois descontos que são transversais a qualquer trabalhador por conta de outrem. Esses descontos são para a Segurança Social e para o IRS.
Para saber qual será o valor do seu salário líquido, é importante que perceba como são estes descontos aplicados, e que fórmulas utilizam.
O cálculo do desconto para a Segurança Social é bastante simples, já que basta aplicar uma taxa de 11% sobre o salário bruto para chegar a este valor. Já o cálculo do desconto para o IRS é um pouco mais complexo.
Para calcular o IRS terá primeiro de descobrir qual o escalão da tabela de retenção do IRS em vigor que se aplicará ao seu caso. Para isso, precisa de ter em conta:
- Estado civil: se é casado (ou unido de facto) ou “não casado”;
- Número de titulares: no caso de ser casado ou unido de facto, se ambos recebem rendimentos sujeitos a englobamento (dois titulares) ou não (um titular);
- Se é portador de deficiência: existem tabelas específicas para portadores de deficiências.
Após saber qual a tabela que se aplica ao seu caso específico, precisará de determinar:
- Número de dependentes: para saber qual a coluna da tabela a aplicar;
- Valor do salário bruto: para saber qual a linha da tabela a aplicar.
Seguindo estas indicações, irá descobrir qual a percentagem que será aplicada ao seu salário bruto para a retenção de IRS.
Estes impostos também incidem sobre o subsídio de refeição?
No que toca ao subsídio de refeição, existe uma nuance que é importante abordar, que é a diferença entre este ser pago juntamente com a remuneração (em dinheiro) ou através de um cartão de refeição.
Caso o subsídio de refeição seja pago em dinheiro, este não estará sujeito a impostos se não exceder os 4,77 € por dia. Se este for pago através de um cartão de refeição, este limite de isenção passa para os 7,63 € por dia. Tudo o que for pago acima deste valor está sujeito a pagamento de impostos.
Como fazer uma simulação e aprender a calcular o salário líquido?
Para fazer o cálculo do salário líquido precisa de aplicar a seguinte fórmula:
Salário líquido = Salário Bruto + Subsídio de Refeição – IRS – Segurança Social
Existem vários simuladores de Salário Líquido online que pode utilizar gratuitamente. Mas, para que compreenda melhor como pode fazer este cálculo, damos-lhe dois exemplos práticos.
Exemplo 1:
- Não casado, sem dependentes e residente no Continente
- Salário Bruto: 800 €
- Subsídio de refeição: 4,77 € por dia, 22 dias úteis, pagos em dinheiro
Neste caso, a tabela de IRS a aplicar será a tabela I das tabelas de retenção na fonte para o Continente. Como neste exemplo não há dependentes, teremos de procurar esta percentagem na coluna correspondente a 0 dependentes.
Como o subsídio de refeição não ultrapassa o valor sujeito a isenção, consideramos apenas a remuneração mensal de 800 € que, neste caso, estará englobada na linha de rendimento correspondente a uma remuneração mensal de “até 814 €”.
Assim, com todos estes dados, chegamos à conclusão de que um trabalhador dependente com as características apresentadas neste exemplo irá descontar 7,9% do seu salário bruto, para efeitos de retenção na fonte de IRS.
Por isso, o cálculo do salário líquido será o seguinte:
Salário líquido: 800 € + 104,94 € (4,7722 subsídio de refeição) – 63,2 € (8007,9% IRS) – 88 € (800*11% Segurança Social) = 753,74 € por mês
Exemplo 2:
- Casado, dois titulares, com 2 dependentes e residentes no Continente
- Salário Bruto: 2000 €
- Subsídio de refeição: 7,63 € por dia, 22 dias úteis, pagos em cartão refeição
Neste caso, a tabela de IRS a aplicar será a tabela III das tabelas de retenção na fonte para o Continente. Neste exemplo existem 2 dependentes, por isso, iremos considerar as percentagens na coluna correspondente a 2 dependentes.
Como o subsídio de refeição não ultrapassa o valor sujeito a isenção, consideramos apenas a remuneração mensal de 2000 € que, neste caso, estará englobada na linha de rendimento correspondente a uma remuneração mensal de “até 2090 €”.
Assim, com todos estes dados, chegamos à conclusão de que um trabalhador dependente com as características apresentadas neste exemplo irá descontar 19,6% do seu salário bruto, para efeitos de retenção na fonte de IRS.
Por isso, o cálculo do salário líquido será o seguinte:
Salário líquido: 2000 € + 167,86 € (7,6322 subsídio de refeição) – 392 € (200019,6% IRS) – 220 € (2000*11% Segurança Social) = 1555,86 €
OE 2022: Possíveis alterações aos escalões de IRS
A carga fiscal sobre os portugueses foi um dos temas mais abordados ao longo da campanha eleitoral para as legislativas que tiveram lugar no passado dia 30 de Janeiro de 2022. Estas eleições resultaram na vitória do PS, ao atingirem a maioria absoluta com 41,5% dos votos.
Isto faz com que seja muito provável a aprovação da proposta do OE 2022, que inclui a alteração dos escalões de IRS de 7 para 9 escalões, devido ao desdobramento dos atuais 3º e 6º escalões.
O atual 3º escalão engloba os rendimentos coletáveis entre os 10 732 € e os 20 322 €, aos quais é aplicada uma taxa de retenção de IRS de 28,5%. Já o atual 6º escalão engloba os rendimentos coletáveis entre os 36 967 € e os 80 882 €, aos quais é aplicada uma taxa de 45%.
Com a proposta do PS, o 3º escalão passará a englobar os rendimentos coletáveis entre os 10 732 € e os 15 216 €, aos quais passa a ser aplicada uma taxa de retenção de IRS de 26,5%. Isto resultará na criação de um novo 4º escalão que englobará os rendimentos coletáveis entre os 15 216 € e os 19 696 €, aos quais continua a ser aplicada a mesma taxa de retenção de IRS de 28,5%.
Consequentemente, terá de haver ajuste de valores dos rendimentos coletáveis abrangidos pelo atual 4º escalão (novo 5º escalão). Assim, este passará a englobar os rendimentos coletáveis entre os 19 696 € e os 25 076 €, aos quais será aplicada a mesma taxa de 35%.
Já em relação ao atual 6º escalão, este resultará nos novos 7º e 8º escalões. O novo 7º escalão irá englobar os rendimentos coletáveis entre os 36 757 € e os 48 033 €, aplicando-lhes uma taxa de 43,5% e o novo 8º escalão englobará os rendimentos coletáveis entre os 48 033 € até 75 009€, aplicando-lhes a mesma taxa de 45%.
Finalmente, também os valores dos rendimentos abrangidos pelo atual 7º e último escalão (novo 9º escalão) serão atualizados, passando a englobar os rendimentos coletáveis superiores a 75 009 €, em vez dos atuais rendimentos superiores a 80 882 €, aplicando a mesma taxa de 48%.
Saber calcular o seu salário líquido é indispensável para que possa avaliar corretamente se uma nova oportunidade é efetivamente vantajosa ou não, e para que negoceie melhor com o seu atual ou futuro empregador.
Isto porque não será o valor do salário bruto aquele com que irá contar para fazer a gestão do seu orçamento familiar. A esse montante terá ainda de retirar o valor dos impostos a pagar à Segurança Social e a retenção na fonte do IRS. Por isso, é essencial que compreenda como funcionam estes impostos e como são calculados, para que não tenha surpresas desagradáveis no final do mês.
Felizmente, são as entidades patronais que se preocupam com o pagamento destes valores às Finanças e à Segurança Social em seu nome, pelo que não precisará de se preocupar com essa parte, caso trabalhe por conta de outrem.
No entanto, para facilitar este trabalho da parte das empresas, é importante apostar num sistema automático que faça estes cálculos e todo o processamento salarial e de obrigações declarativas.