A escala e a velocidade a que vivemos, trabalhamos e aprendemos acelerou desde o advento da web. Os espaços de *Coworking* foram respondendo a estas mudanças, abrindo o campo para as alterações profundas que hoje começamos a ver nas empresas e nas instituições, como o teletrabalho. Descubra um pouco mais sobre a evolução do *Coworking* em Portugal.
![Empreender em Tempos de Pandemia – Coworking e Colaboração](/assets/blog/0221/opiniao-coworking-empreender-pandemia.png)
# A evolução do Empreendedorismo em Portugal
Escrever sobre empreendedorismo e sobre o futuro do trabalho remete-me sempre para o meu saudoso amigo e colega Diogo Vasconcelos (1968-2011). A revista Ideias & Negócios, que lançou nos anos 90, brotou da Forum Estudante, o laboratório criativo do Rui Marques – feito de equipas que sempre soube construir e liderar – de onde saíram tantos outros projetos editoriais e sociais nesses primeiros anos da revolução digital em Portugal.
Pouco se ouvia o verbo empreender. A Ideias & Negócios apontava diretamente ao ato empreendedor na primeira pessoa, recusando a inevitabilidade de um percurso linear no seio da empresa.
De facto, para um jovem profissional, até ao fim dos anos oitenta, a ideia de ingressar numa empresa antecipava um plano de permanência a médio ou mesmo longo prazo. Imperava a vontade de singrar e subir na estrutura corporativa, aumentar o vencimento e as correspondentes responsabilidades e, eventualmente, chegar ao topo ou, pelo menos, a um nível diretivo do projeto. Um plano a dez ou quinze anos era expectável e até desejado.
O prazo de validade do que se aprendia era bem mais alargado do que o modo *always on* que vivemos hoje nos modos de aprender. A escala e a velocidade a que vivemos, trabalhamos e aprendemos acelerou de forma constante desde o advento da web, há trinta anos e, como se não bastasse, estas dimensões ameaçam agora fundir-se numa só. Precisamos mesmo de um lugar para aprender, outro para trabalhar e outro ainda para tudo o resto (há quem lhe chame viver)?
Acompanhando a escala e a velocidade das redes, o trabalho foi mudando drasticamente, produzindo novos profissionais, independentes, muito diferentes do freelancer pré-internet. A portabilidade dos computadores e o acesso ubíquo à internet, potenciado pelas redes sem fio, começou a libertar da geografia da empresa os profissionais das áreas do design, da programação e desenvolvimento web, do marketing, da produção de conteúdos e de muitas outras áreas emergentes da revolução digital que se seguiria nas décadas seguintes. Este contingente de independentes, de natureza nómada e flexível, teve um crescimento exponencial nos últimos trinta anos, ao ponto de constituir hoje quase 50% da força de trabalho nos EUA.
# A importância dos *hubs* criativos/espaços de *cowork*
Lisboa – numa primeira fase – e depois o resto do país, também acompanhou esta tendência. Uma das evidências do crescimento desse ecossistema criativo e empreendedor foi a abertura de espaços dedicados a estes novos profissionais, dos espaços de *Coworking* às incubadoras, e destas aos espaços *Maker* e similares. No caso dos espaços de *Coworking*, 2009 e 2010 são os anos de arranque do Liberdade 229 (avenida e número, respetivamente) e do Coworklisboa, na LX Factory.
O Liberdade 229 provava, de imediato, que estes espaços consistem numa extensão da “sala de estar”, e que era possível desenvolver uma comunidade sem optar pelo *open space*. Já o Coworklisboa nascia num dos espaços mais criativos da cidade, assumindo um papel polinizador que contribuiu de forma decisiva para a disseminação do movimento de *Coworking* por todo o país. Apenas quatro anos depois, a conferência Coworking Europe acontecia em Lisboa, reunindo mais de 400 participantes de todo o mundo.
Os espaços de *Coworking*, um pouco por todo o mundo, foram informando e respondendo a estas mudanças aceleradas na forma como trabalhamos, abrindo o campo para as alterações profundas que hoje, dez anos depois, começamos a ver nas empresas, nas instituições e nos Estados.
![Coworking e Empreendedorismo](/assets/blog/0221/fernandemendescoworkinginvoicexpress.png)
Um espaço de *Coworking* é, por si só, um *hub* criativo, na medida em que proporciona e potencia a colisão de pessoas e projetos oriundos das mais diversas áreas do conhecimento. Dessa colisão resulta muitas vezes o ato empreendedor, a solo, no modelo *startup* ou outros. A prová-lo estão os números na LX Factory, que beneficiou imenso com a quantidade de novos negócios nascidos no Coworklisboa, e que depois escalaram em termos de equipa e consequentemente de espaço.
À escala de Lisboa, de forma orgânica e espontânea, surgiram outros espaços e projetos, constituindo muito rapidamente uma rede neuronal de *Coworking*, incubadoras e espaços *Maker*. Essa rede, apoiada pelo elenco governativo da cidade, ajudou a posicionar Lisboa como cidade criativa, aberta e promotora de inovação. O fenómeno teve raiz informal, ou seja, nenhum plano formal foi traçado, pelo contrário, muito do que de bom aconteceu entre 2010 e 2020 teve sobretudo um carácter auto-organizado, ainda que sempre apoiado por quem geria a inovação e a economia da cidade. A marca *Made of Lisboa* é o corolário natural desse processo que, repito, tem origem na vontade individual de muitos actores da cidade nesses anos.
# A tendência do Trabalho Remoto: Coworking em tempos de Teletrabalho
A terrível pandemia que enfrentamos desde Março de 2020 suspendeu uma boa parte deste ecossistema criativo e empreendedor. A maioria dos nossos espaços e projetos vivem, como digo acima, da colisão criativa entre indivíduos e destes com outros projetos, empresas e instituições. No entanto, uma dimensão que para nós era já uma forma natural de trabalhar – à distância, em modo flexível e portanto a partir de onde quiséssemos – foi imposta, mas em contexto da emergência que vivemos.
O Teletrabalho é tudo menos uma novidade. No início dos anos 2000, eu próprio já trabalhava dessa forma, pedinchando uma mesa, um sofá ou mesmo uma sala aos meus clientes, quando os visitava para reuniões ou apresentações (sou um designer, antes de tudo). A questão é o enviesamento que o conceito sofreu, confundindo-se trabalho remoto com trabalho em… casa.
Se um espaço de *Coworking* pode ser descrito como uma extensão da nossa casa, o contrário não se verifica, exatamente porque em casa não beneficiamos da diversidade que encontramos nestes espaços. Assim, é importante estabelecer a diferença entre os benefícios reais do teletrabalho – posso trabalhar a partir de onde quiser – e aquilo que está a acontecer em contexto de emergência – tenho de trabalhar em casa –, afetando na mesma medida a dimensão do ensino e da aprendizagem.
Não confundamos as coisas. Trabalhar em casa faz mal à saúde. Por outro lado, o trabalho remoto, como expressão da desmaterialização geográfica do trabalho, é uma realidade e veio para ficar.
![Teletrabalho vs Trabalho Remoto](/assets/blog/0221/fernandomendesteletrabalhoinvoicexpress.png)
No início da pandemia, os habituais profetas da desgraça foram céleres em decretar o fim dos espaços de Coworking e, de facto, estes espaços continuam a sofrer o impacto do distanciamento físico e social que o maldito vírus nos impõe. Para espaços que vivem da proximidade, do contacto e mesmo da colisão, é fácil entender que o quadro atual não permite uma vida normal aos *coworkers*.
No entanto, ao mesmo tempo que se decretava este fim do Coworking, outros iam prenunciando que, pelo contrário, estes seriam os espaços de eleição assim que a pandemia desse algum tipo de trégua, sobretudo com a chegada dos indivíduos e das empresas que, até agora, não teriam ainda abraçado a ideia de desmaterializar o tradicional (e solitário) escritório. A procura aumentou imenso entre as duas vagas da pandemia (de Maio a Agosto) para agora sofrer novo revés.
# Colaboração: Individualidade vs Comunidade
*Coworking* é mais do que um espaço para trabalhar, é sobretudo uma resposta social a muito do que nos aflige como humanos. Precisamos de outros, somos seres eminentemente sociais. Precisamos de aprender com os nossos pares, porque a escola não consegue acompanhar a escala e a velocidade do mundo que vamos construindo. Precisamos de visibilidade do nosso trabalho e de aumentar a nossa rede pessoal de contactos, de forma efetiva e consequente. Nada bate um bom espaço de *Coworking* em termos de network e inovação, porque a diversidade e a abertura são o combustível natural e sustentável da criatividade humana. O *Coworking* é um verbo, não apenas um substantivo.
E como verbo, colaborar é hoje um termo usado até à exaustão, na maioria das vezes de forma simplista, como se fosse algo passível de ser decretado ou imposto. Não é da natureza dos indivíduos colaborar quando tal não é necessário. Para ir mais longe, mais a fundo e sobretudo com maior rigor, seria obrigado a citar o trabalho e pensamento de grandes autores, relevantes para o estudo do que é a colaboração. Darwin e Kropotkin são referências tão imediatas quanto incontornáveis. Se o primeiro postulou sobre a evolução e a consequente competição entre indivíduos, o segundo dedicou-se à ideia da ajuda mútua e, por conseguinte, ao conceito de reciprocidade. Para Darwin ganha o que melhor se adapta, Kropotkin prefere olhar para a dimensão e responsabilidade única e singular do indivíduo. Não por acaso, o pensamento deste último vai ganhando nova relevância num mundo globalizado, de rede ubíqua e total sincronia, que é na realidade movido pela ação de milhões e milhões de indivíduos.
Se o ato de colaborar não é imediato, então a colaboração deve acontecer se for criada ou iluminada uma determinada necessidade. Esse campo comum, esse “problema”, é o que nos faz colaborar, retribuindo o que nos é oferecido. Nesse pacto, não há mais do que o benefício mútuo do resultado obtido. Se a colaboração corresponder a um ato forçado, não raras vezes esse resultado, quando acontece, é um perfeito desastre. Nesse sentido, a colaboração pode ser estimulada; o ambiente pode ser desenhado para propiciar a colaboração; mas, como o amor, não pode ser imposta ou decretada.
De volta aos espaços de *Coworking*, é fácil perceber porque o “software livre” que lhes dá origem é potenciador da colaboração. Sem demasiadas regras, imposições, normas e modos de ser e fazer, cada *coworker* procura nestes espaços aquilo de que necessita, de uma forma que nunca é intrusiva, dado o carácter auto-organizado e *leaderless* em que se opera aqui.
Outro termo do jargão atual é a velhinha “Comunidade”. Também aqui se abusa e volta a abusar da palavra. Temos hoje a figura do “gestor de comunidade” ou, mais recentemente, do “gestor da felicidade [corporativa]”. Nada contra estas novas designações desde que seja compreendido que fazer essa “gestão” implica a participação direta nessa mesma comunidade. Não se gerem comunidades, sejam elas quais forem, a partir de fora. É sendo mais um que se pode ganhar e garantir a confiança dos pares. Esta gestão é muito óbvia nos espaços criativos atuais, onde esta tarefa é quase sempre desempenhada por alguém que começou por ser apenas um *coworker*. Apenas mais um, portanto.
# NOW – O que é o No Office Work
Do Coworklisboa (2010) ao meu atual projeto nesta área, o NOW No Office Work (no Beato), todos os “gestores de comunidade” tiveram um papel absolutamente essencial. Do Pedro à Laura e da Rita ao Paulo, todos e todas chegaram a essa posição e responsabilidade por personificarem o protótipo ideal. Pela abertura, pela disponibilidade, mas também pela proatividade e empenho na construção de uma ideia que não é comum, mas que, pelo contrário, abraça todas as diferenças, todas as cores, todos os credos e, sim, todas as profissões.
O NOWBeato é hoje um projeto muito diferente do seminal Coworklisboa. Nem outra coisa seria de esperar, já que cada espaço vive da sua comunidade específica. Percebi isso muito cedo, quando tentei a primeira expansão séria do Coworklisboa (na Central Station, um proto hub criativo que funcionou num edifício junto ao Mercado da Ribeira).
Mesmo com a migração de uma parte da equipa e até de alguns *coworkers*, o Coworklisboa Central Station nunca foi o Coworklisboa original e por uma razão simples: as comunidades não são replicáveis. São fruto do que acontece num determinado espaço, num determinado momento, com determinadas pessoas.
O NOWBeato é um hub criativo na medida em que é teto para projetos e pessoas que, pela sua diversidade, garantem colisão criativa, de que resulta impacto e mudança de vida(s). É um orgulho podermos juntar, num mesmo antigo armazém da zona oriental da cidade, uma marca com a relevância e notoriedade da Mercedes (equipa digital da marca); a agência *killer* Jack The Maker; o maravilhoso Manicómio, do Sandro Resende e de cada um dos seus artistas; a Wonder Wall que faz maravilhas em verde; a ByAR que nos aumenta a realidade; a recente GRACE; a minha sócia, a criativa e inovadora iMatch (empresa mãe do Ignite Portugal); e outros *coworkers* que vão alegrando aqueles três pisos, numa das zonas mais pobres da cidade.
# NOW – Coworking com o Lado Simples da Faturação
Deixo para o fim, uma declaração de amor a um software de facturação. Estranho, não é?
Antes que comecem a duvidar da minha sanidade mental, pensem que esta peça de código e respectiva interface me acompanha quase desde 2010. A equipa que lhe deu vida estava ali diariamente ao meu lado, primeiro no Coworklisboa e depois no tal contributo à LX Factory, quando a equipa do InvoiceXpress cresceu de tal forma que não restou alternativa senão migrarem para a sala ao nosso lado.
Ficaram sempre por perto. Assim como o InvoiceXpress, que é como eu. Simples, prático e que não me faz perder tempo com miudezas.
*Long live, InvoiceXpress!*